quarta-feira, 20 de agosto de 2014

AS TARTARUGAS NINJA (2014) - Crítica



Ah, década de 1990!

Tempos que não voltam mais!

Épocas em que víamos um Batman com mamilos em sua armadura; Víamos um Capitão América com uma roupa tão colada em seu corpo, que mais parecia tatuagem; Víamos um Quarteto Fantástico que de tão ruim, nem mesmo chegou ao cinema. E víamos também, Tartarugas Ninja interpretadas por atores fantasiados, com cabeças robóticas.

Nos tempos de hoje, as características descritas acima soam como obsoletas e em alguns casos (Batman com "tetinhas", por exemplo) até mesmo ridículas. Como explicar então que um filme, de baixo orçamento e baixa expectativa possa ter funcionado tão melhor que o seu reboot de 2014, com muito mais recursos e muito, MUITO mais dinheiro envolvido?

Dizendo apenas que Michael Bay está envolvido na produção (é o produtor) já poderia responder a esta pergunta. Mas na verdade, os reais motivos pelos quais As Tartarugas Ninja desapontam tanto em sua nova empreitada cinematográfica, vai muito além disso.

Para começar, a história que se desenrola a partir da sinopse a seguir, já esdrúxula (que fracassa também por alterar parte da origem dos heróis) : April O'Neil (Megan Fox) é uma repórter que quer mais de sua própria carreira (juro que evitei o máximo para não abrir comparativos mentais com Bruce Nolan de Todo Poderoso, mas não consegui). Por isso, sempre insiste em correr atrás de histórias polêmicas que ninguém quer levar a sério. Em uma dessas aventuras, ela encontra as Tartarugas Ninja, um grupo de répteis mutantes lideradas por Splinter (Danny Woodburn) um rato igualmente alterado geneticamente. O objetivo de Leonardo (Johnny Knoxville), Dontaello (Jeremy Howard) , Raphael (Alan Ritchson) e Michelangello (Noel Fisher) - as tartarugas - é impedir os constantes ataques do Clã do Pé, comandadas pelo Destruidor.

O primeiro ato do filme até revela-se interessante. O mistério sobre a aparência das Tartarugas criado por Jonathan Liebesman (diretor) de fato atinge o objetivo de aguçar o interesse pela estética daqueles personagens (ainda que já os tenhamos visto nos trailers divulgados). A sequencia de cenas onde os Ninjas agem pela primeira vez e a sequência do metrô, ainda que conduzidas com extremo amadorismo por parte de seu diretor, criam um suspense eficaz.

Entretanto, a partir daí o filme vai, gradativamente, desinteressando seu espectador. É escancaradamente notória a influência de Michael Bay - responsável pela "saga" (risos infinitos!) Transformers. Funcionando quase que como uma assinatura do cineasta, este As Tartarugas Ninja sofre com os mesmos problemas dos filmes dos robôs gigantes: Cenas de ação frenéticas, com jogos de câmeras movendo-se em ritmo alucinador, explosões, péssimas edição e fotografia, diálogos pedestres, explosões, superestimação de Megan Fox, explosões e para completar um enredo raso, fraco, e sem originalidade nenhuma, contando com uma revelação das motivações no vilão do filme mais do que patéticas. Ah sim... e explosões também.

Falhando também em ignorar o elemento mais atrativo daqueles filmes da década de 1990, as cenas da luta são incompreensíveis. Ainda não acredito que quase não vi as Tartarugas Ninja lutarem, sendo que fui ao cinema para isso. Isto, porque Liebsesman, obviamente orientado por Bay, prefere quase deixar o espectador com tontura, do que conferir o aspecto mais artesanal e muitíssimo mais eficiente do que as projeções antigas.

Entretanto, alguns elementos são dignos dos fãs dos heróis, que acompanham sua trajetória desde a série animada de 1987. Aqui e ali, os realizadores desta projeção jogam referências aos filmes originais e em até certo ponto respeitam a essência de cada personagem: Splinter é o mestre. Leonardo é o líder. Raphael é o revoltado. Donatello é o nerd. Michelangello é o palhaço. Personalidades que de tão simples, acabam também descaracterizando os personagens neste longa. As vestimentas e acessórios incorporados no estilo de cada um nada tem a ver com sua origem e NÃO! Releitura de personagens clássicos, NÃO permitem desrespeito à sua mitologia. Caso contrário, seria aceitável vermos um Homem Aranha que dispara teias pelos pés, ou então um James Bond que voa.

Para completar, a atuação de Megan Fox é terrível! Sou capaz, sem medo de exageros, de afirmar que esta é uma das piores atuações que já vi na vida. Whoopi Goldberg, em seu desespero em não cair no esquecimento do público, nada acrescenta. William Fitchner, em toda a sua maldade e vilania, não tem a capacidade de se tornar ameaçador em nenhum momento e tudo é prejudicado, como já dito acima, pelas ridículas motivações que seu personagem possui.

Existe uma lógica ilógica por trás do cinema: Um filme de uma década já antiga pode ser ridículo e obsoleto. Ele ganha esses rótulos se no presente, é feito um reboot com qualidade infinitamente superior aos seus originais. Mas um filme pode também, se tornar mais clássico a cada tentativa fracassada de novas projeções sobre aquele tema. No caso das Tartarugas Ninja, os filmes da década retrasada são clássicos pelo simples fato de serem MUITO melhores do que o atual - e o ridículo, de 2007. O que é uma pena, pois seria possível fazer algo mais interessante com o material que se tem nas mãos. Infelizmente, até agora mãos sem muito talento tiveram acesso à esse material. As melhores de todas até agora, foram as que respeitaram o seu público.

PLANETA DOS MACACOS: O CONFRONTO - Crítica



Inegavelmente, a franquia Planeta dos Macacos já passou por maus bocados em sua história. Desde o lançamento do seu primeiro longa, em 1968, que foi aclamado pela crítica e é considerado até hoje um dos clássicos de Hollywood, mais seis filmes receberam o título: Três deles, continuações do original, na década de 1970, um de 2001 (verdadeiramente sofrível) e dois que constituem o reboot iniciado em 2011. O fato é que a franquia ficou mais de 40 anos esperando que alguém lhe desse uma nova chance digna no cinema. Como já dito acima, em 2011 esta chance foi dada. Planeta dos Macacos : A Origem é um filme a ser admirado sob muitos aspectos. O primeiro deles é o sistema de captura de movimentos utilizado, que já na ocasião, se mostrava eficaz e orgânico o suficiente para satisfazer o espectador. Além disso, enredo, direção, elenco, edição e montagem (e particularmente, acrescento trilha sonora à esta lista) fizeram deste um dos melhores filmes daquele ano, quebrando desconfianças e até mesmo certezas de que a franquia seria incapaz de se reinventar de maneira positiva.

Em 2014, esta história continua. Planeta dos Macacos: O Confronto segue a "tradição" de seu antecessor e se estabelece como um dos melhores filmes do ano de seu lançamento.

O filme parte do princípio deixado ao fim do primeiro capítulo: A "Gripe Símia", resultado dos experimentos com a droga ALZ-112, dizima grande maioria da raça humana, deixando vivos apenas os indivíduos geneticamente imunes ao vírus. Em paralelo à isso, a sociedade iniciada e liderada por César (Andy Serkis) cresce e prospera cada vez mais. Agora, o grupo de macacos é uma sociedade organizada, onde cada elemento possui uma função bem definida. Humanos e Macacos entram em conflito quando os primeiros descobrem que podem restabelecer a energia elétrica restaurando uma represa que encontra-se dentro do território dos Símios.

A premissa do filme, descrita acima, de imediato revela-se genial por ser interessante, e mostra-se reflexiva à nossa realidade ao longo da projeção: Como não entrar em guerra com um grupo de indivíduos, se estes possuem algo que é fundamental para que o grupo ao qual eu pertenço sobreviva?

E é a partir das diferentes respostas para esta pergunta que este O Confronto ganha mais brilho à cada cena. Em ambas as sociedades existem líderes, indivíduos pacificadores e indivíduos radicalmente revolucionários. E é justamente a personalidade de cada um destes elementos que tornam a convivência entre Humanos e Símios intrigante. Um dos grandes acertos de Matt Reeves (diretor) é não caricaturizar os personagens, não tornando-os seres unilaterais e previsíveis. Pelo contrário, é o conflito interno de cada um que nos faz ansiar por saber como a história se desenrolará: Qual caminho deve-se escolher? O da pacificidade vulnerabilizadora, ou a da agressividade fundamentada pelo medo do outro?

Interessante notar também, a perspectiva escolhida pelo diretor para retratar as duas sociedades: Ao mostrar o lar dos Símios, Reeves sempre opta por utilizar imagens panorâmicas, nos induzindo a conferir a grandiosidade e o crescimento admirável da população liderada por César. Ao mostrar o albergue onde os Humanos se localizam, ângulos fechados e apertados são a decisão mais do que perfeita, para que se mostre que a raça humana está aos poucos, se definhando, novamente lançando uma reflexão aos espectadores: Quão longe estamos de situações como estas, onde precisaremos lutar dia após dia pela nossa sobrevivência, sem recursos dos quais hoje somos escravos?

O aspecto técnico do filme é também impecável do ponto de vista artístico, uma vez que o CGI empregado é tão perfeito que chega a ser imperceptível a artificialidade virtual dos personagens concebidos segundo esta tecnologia. As rugosidades das faces dos Símios, a tremulação de suas pupilas e o sutil moviementos de suas narinas e bocas, são detalhes que, mais uma vez, fazem toda a diferença.

O elenco mostra-se eficaz, mas menos interessante que o antecessor: Gary Oldman e Jason Clarke, poderiam ter conferido mais veracidade aos seus personagens, pois a história particular de Dreyfus e Malcom, respectivamente, dariam abertura a interpretações mais contundentes. Andy Serkis é o mesmo gênio, como de costume. Destaque também ao elenco que interpreta os outros macacos da sociedade símia, que injustamente são pouco creditados, pois aqui realizam um trabalho tão perfeito quanto o de Serkis.

Outra característica marcante do filme (que gerou indevidas contradições em seu antecessor) é a capacidade dos macacos falarem. Aqui, funciona como uma ferramenta dramática encaixada perfeitamente no enredo da projeção. O fato de César e seus liderados ainda possuírem dificuldade em pronunciar palavras perfeitamente, torna a atmosfera de transição entre seres irracionais e racionais mais plausível e, particularmente mais intimidadora. Impossível deixar de sentir a mesma admiração e medo também, de certo personagem que ao conferir a habilidade dos primatas, sente-se ameaçado e adota uma postura agressiva ao menor contato com os mesmos.

Planeta dos Macacos: O Confronto é a confirmação de que a franquia efetivamente voltou e com mais algumas sequencias sob os mesmos cuidados de seus dois capítulos iniciais, pode ficar na história do cinema. Basta saber, se o estilo e a qualidade adotadas até aqui, serão preservadas futuramente. Mas uma coisa é mais do que certa: César e sua comunidade podem ainda render grandes obras e ao que parece, vai salvar a reputação do livro francês, de 1963,  La planète des Singes , de Pierre Boulle, cuja criação, depois de quatro décadas, finalmente, ganhou uma releitura complexa, sombria e simplesmente fascinante.